As Últimas Horas de Marseille (21 de Marco de 2004)
Na manhã de 30 de setembro de 1942, a base aérea de Quotaifiya, base do JG 27, estava coberta por uma névoa espessa trazida do mar pelo vento forte. Logo após a alvorada, as equipes de terra começaram a preparar os aviões do 3.Staffel para a decolagem. Os aviões eram Messerschmitt Bf 109 G-2 novos em folha, e eles estavam substituindo os Bf 109 F-4 que estavam em uso pelos pilotos de caça alemães na África. Os novos aviões tinham melhor performance, e superavam os Spitfire Mk.V usados pelos ingleses. O ponto falho do Bf 109 G-2 era o sistema de refrigeração inadequado para o motor Daimler-Benz DB 605A-1.
Pouco antes da decolagem, o barbeiro do esquadrão Ogf. Boguschewski tentava explicar seu pedido de uma maneira particularmente confusa:
- O que é isto, Sr. Boguschewski?
- Eu gostaria de lhe pedir, Capitão, uma foto grande com um autógrafo.
- Tudo bem, mas para que?
- Em tempo de paz, eu gostaria de ser um barbeiro independente. Se eu pendurar a foto do Capitão na minha janela, isto será muito significativo: Eu fui o barbeiro pessoal do Capitão Marseille.
Marseille atendeu plenamente o pedido de seu subordinado e caminhou na direção dos aviões estacionados na periferia da base aérea. Aquela seria sua primeira missão em um novo avião. As 10:47, ele decolou numa formação de oito aviões do seu esquadrão. A missão deles era proteger Stukas e então iniciar uma caçada por aviões inimigos. Dez aviões do III.JG 53 e 15 do III.JG 27 estavam diretamente responsáveis pela proteção dos bombardeiros de mergulho. Sobre a linha de frente, ocorreu o encontro com diversos Kittyhawks dos esquadrões 112 e 250. O Tenente Schroder abateu um avião inimigo. O esquadrão comandado pelo Hauptmann Marseille não participou do combate. Ao mesmo tempo, os Stukas lançaram sua carga de bombas nas posições Britânicas, e se direcionaram de volta a base. Os pilotos do 3./JG 27 iniciaram sua lenta caçada por aviões inimigos. Os caças alemães eram direcionados por um centro de controle em terra, coordenado pelo comandante de regimento Major Eduard Neumann. Ele direcionou o esquadrão para um grupo de aviões inimigos no sul de Imayid. Quando os Messerschmitts se aproximaram desta localização, os aviões inimigos escaparam seguindo norte, e o combate aéreo não aconteceu.
O relato desta ação pode ser encontrada nos registros de combate do JG 27:
11:30h
Uma voz clara através do rádio pode ser ouvida:
- "O motor está pegando fogo!"
No centro de comando há confusão, e todos perguntam:
- "Qual motor está queimando? O que está acontecendo?"
- "Do Elbe 1. Há cada vez mais fumaça no cockpit. Eu não consigo ver nada."
- "Elbe 1? Meu Deus! Este é Marseille! Olhe para o mapa, vocês estão a cerca de 5 minutos da linha de frente, algo em torno de 40 km."
Os aviões do terceiro esquadrão estão voando em formação cerrada, todos olham tensos para o Amarelo 14. Schlang e Pöttgen estão a poucos metros de Marseille. Eles podem ver claramente seu rosto pálido através do canopy. Ele abre um lado da janela com sua mão esquerda. Fumaça branca está saindo do cockpit...
- "Nós estamos sobre as nossas linhas? Eu não consigo ver nada".
- "Mais dois minutos, Jochen." - calmamente responde Pöttgen.
Através do rádio Marseille recebe a direção de vôo.
- "Elbe 1, mantenha-se mais a direita!"
Ao mesmo tempo, os amigos espantados reunidos na tenda do controle de vôo perguntam:
- "Você vai conseguir Elbe 1? Do contrário pule!"
Fumaça branca cada vez mais espessa sai da cobertura do motor do avião de Marseille, mas ainda não há chama. O avião está perdendo altitude.
11:35h
Uma mesquita branca com uma brilhante meia lua dourada no topo da torre pode ser vista em Sidi Abd El Rahman. Aquelas eram as posições alemãs. Marseille conseguirá. Os soldados observam o grupo de caças no ar através dos óculos de campo. Chamas vindo do motor de um Messerschmitt são claramente visíveis.
O comandante de regimento, Neumann, disse com traquilidade ao grupo de pilotos:
- "Eles estão sobre El Alamein. Nada de mau pode acontecer agora. O pior seria um pouso forçado."
Um minuto mais tarde, Marseille chama quase asfixiado:
- "Eu tenho que pular. Eu não posso suportar mais!"
No momento seguinte um voz pode ser ouvida:
- "Ele virou seu avião de cabeça para baixo!"
- "Jochen pulou!" - Voz de Pöttgen.
Os segundos passam. Os amigos reunidos no posto de comando estão cada vez mais apreensivos, então eles ouvem uma voz através do rádio:
- "Ele está morto! Ele está morto!"
Todos estão paralisados. Edu Neumann, com o rosto pálido, deixa os fones de ouvido de lado, e olha diretamente para os olhos de todos. Sem dizer uma palavra balança sua cabeça e vai embora. Após o pouso de todos os aviões, eles ficam sabendo do que aconteceu no ar. Sobre as linhas alemãs, Marseille se livrou do canopy e virou seu avião de cabeça para baixo. O avião imediatamente entrou num mergulho vertical. Temeroso por sua vida, Marseille pulou do avião. Seu pára-quedas não abriu. Seu corpo imóvel caiu quase verticalmente. Todo o evento foi testemunhado por seus amigos incrédulos. Os aviões circularam o local do acidente algumas vezes. O acontecimento deve ter afetado Paul Geisinger, que era responsável por dobrar os pára-quedas. O pára-quedas que ele havia dobrado não abriu. Ele nem mesmo queria pensar nesta hipótese.
Winkelmann e o Hauptmann Franzisket, doutores do alto comando, resgataram o corpo de Marseille do deserto. Eles explicaram que a alça que abriria o pára-quedas não tinha sido puxada. Do lado esquerdo do torso havia um corte profundo causado pela pancada de um objeto, mas não era resultado da queda no solo. Quando pulou do avião, Marseille foi atingido pelo estabilizador na cauda, e perdeu consciência instantaneamente. Ao mesmo tempo, o avião estava em um mergulho acentuado, em outras palavras, a pior posição possível para saltar. Marseille não tinha total ciência da situação, pois sua visibilidade estava obstruída pela fumaça que era expelida do motor, do contrário ele teria corrigido esta situação movendo ligeiramente o manche.
Neumann, o responsável pelos registros do esquadrão, fez a última anotação no livro de vôo do falecido comandante Marseille: 388 missões de combate e 158 aviões inimigos abatidos. O número do último vôo: 482. Duração: 49 minutos. No campo "Tempo de chegada", ele desenhou uma cruz negra.
Lentamente todas as peças do quebra-cabeças começaram a se encaixar. O avião atingiu o solo as 11:36, próximo à linha de telégrafo, 7 km no sul da mesquita branca. Os destroços foram examinados minuciosamente. Durante o impacto quase vertical a partir de uma altitude de 3000 metros, o motor Daimler-Benz DB 605A-1, com o número de série 77411 foi completamente destruído. A inspeção não encontrou nenhum sinal de sobreaquecimento no eixo do comando de válvulas, a parte móvel e cobertura dos cilindros. Não havia nenhum sinal de desgaste intenso. Baseado nas constatações, o fogo, que começou e aumentou durante os últimos 6 minutos de vôo, não indicava ter sido causado pela perda do fluído de resfriamento, ou do óleo do motor. Como a cor da fumaça era de branca a cinza clara, a possibilidade de fogo no combustível estava fora de questão, pois do contrário a temperatura teria sido muito alta, forçando o piloto a abandonar o avião imediatamente. Neste momento, danos nas engrenagens de redução foram encontrados, alguns dentes na roda frontal da montagem estavam faltando. Isto ocasionou um vazamento que resultou no princípio de incêndio.
O avião era um Bf 109 G-2, número serial 14256, totalmente novo, produzido e licenciado pela fábrica Erla e entregue através de Bari. Aquele foi o primeiro vôo de combate do avião. Nenhum problema técnico fora encontrado nos testes de solo, ou mesmo antes disto, durante a transferência para a base aérea do terceiro esquadrão.
O relatório que foi feito pela comissão de investigação do acidente recebeu o número 270/42, e terminava com a seguinte frase:
"Sabotagem, ou falha de terceiros não foi comprovada."
Tradução: Erick Sart.
Fonte: JG 27 Volume I, por Marek J. Murawski
Mais uma história tirada do ótimo site www.cockpitnews.com.br
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